Segurança: um direito social.
Antonio Fernando de Souza*
Em nosso país, o tema segurança pública sempre foi um assunto colocado à margem. A sociedade sempre o desprezou e isso se refletiu por muitos anos na ausência dos movimentos sociais e mesmo das academias nas discussões em geral e na formulação teórica sobre esse tema, como se isso fosse de interesse apenas do Estado. Em conseqüência, o Estado acabou se responsabilizando por isso e constituindo polícias e políticas de segurança pública que não ultrapassavam a defesa do Estado contra o cidadão ou a defesa dos que têm contra os que não têm, partindo-se da constatação de que os que nada têm nunca são ouvidos quando se trata de assuntos do Estado.
Acrescente-se a essa “receita” o último período ditatorial, quando as polícias militares de todo o país foram usadas como forças auxiliares de repressão a todos que não concordavam com o regime, reforçando e aprofundando a cultura de uma polícia como instrumento do Estado contra o cidadão e não em defesa deste, tanto que, pela constituição de 1979, os comandantes das polícias eram sempre um oficial (coronel) do Exercito Brasileiro. Com a ausência da sociedade e principalmente da academia no debate sobre segurança pública, as polícias sendo consideradas forças auxiliares às Forças Armadas e o comando delas nas mãos de oficiais quase sempre ligados à repressão política formou-se uma geração de oficiais PMs com uma visão de segurança pública baseada no conceito de “inimigo interno” da Lei de Segurança Nacional.
Vem a redemocratização e com ela a Constituição Cidadã, que insere no capítulo dos Direitos Sociais a segurança pública como um direito de todos e um dever do Estado. Mais ainda, atribui funções à União, aos Estados e aos Municípios na garantia desse direito. Com isso nasceram as guardas municipais, quase todas repletas dos mesmos problemas das polícias militares, principalmente porque nasciam sob o comendo e a inspiração daquela geração de oficiais de polícia formada na doutrina da LSN e na teoria do INIMIGO INTERNO.
Com a redemocratização, a única política de segurança existente cai em descrédito sem que se consolide uma nova e nossas policias, diante do aumento da criminalidade e da violência passam a ações cada vez mais reativas e improvisadas ante as pressões sociais mais ou menos legítimas por medidas de controle e/ou combate a esse fenômeno sem que a discussão avance e se consolide uma política concreta de ações articuladas e propositivas de proteção social. Nesse contexto, surgem duas tendências claramente opostas no terreno da segurança pública: de um lado a sociedade civil discutindo os Direitos Humanos e de outro as polícias e seus agentes discutindo o combate à violência e a criminalidade, como se um assunto fosse independente do outro. Governos conservadores tomavam posições próximas da visão policialesca e governos progressistas se aproximaram dos movimentos pelos Direitos Humanos, quase sempre tratando os profissionais e gestores de segurança pública com reserva ou mesmo com desconfiança.
E são exatamente os progressistas que cometem os maiores erros, pois ao não entenderem segurança pública como um direito social tão importante quanto os demais, deixam de dar aos servidores dessa área sua devida importância. Por isso não consideram os gestores e operadores de segurança quando da promoção de eventos e atividades que impactam na vida dos cidadãos, achando que a eles cabe apenas o papel de executores. Em casos extremos, órgãos de governo aceitam que empresas privadas determinem as ações dos gestores públicos de segurança.
Quando se fala em desmilitarização dos órgãos de segurança, pensa-se em muitas coisas, menos que os movimentos sociais e as forças progressistas precisam, eles também, compreender a segurança como política pública e como um direito social nem mais nem menos importante que o direito à cultura, à Saúde, à Educação e principalmente a Ir e Vir em segurança. Desmilitarizar a segurança pública é mais do que regulamentar e fiscalizar as ações dos trabalhadores em segurança. É também respeitá-los compreendendo que não são importantes apenas como operadores, mas como profissionais capazes de pensar e organizar a sua atuação em defesa dos
interesses da coletividade.
*Professor de Sociologia na rede pública estadual do ES
Fonte: http://www.conseg.gov.br/
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