sexta-feira, 19 de julho de 2019

Carta dos Direitos da Criança no Esporte


A Carta dos Direitos da Criança no Esporte foi elaborada por treinadores esportivos de Genebra. Através dela, se comprometem a respeitar o ritmo de cada um e a proteger crianças e jovens sob sua responsabilidade. Faz-se necessário difundi-la o máximo possível para que aos poucos cada clube, cada treinador e cada pai possam realmente levar em consideração os interesses da criança. Muitas crianças e jovens praticam algum esporte. Mas temos nós consideramos verdadeiramente sua opinião, suas aspirações? Prestamos atenção suficiente à sua saúde e ao seu bom desenvolvimento físico? A moda ou “a obrigação de obter resultados” em competições, às vezes, por acaso, não são contrárias aos interesses vitais da criança?

[A Carta é afixada nos locais de prática, aos cuidados das associações esportivas e dos monitores adeptos do princípio segundo o qual o bem-estar da criança deve prevalecer].

Toda criança tem o
1. Direito de praticar esportes
2. Direito de praticar o esporte por prazer e de jogar como uma criança
3. Direito de desfrutar de um ambiente são
4. Direito de ser tratado com dignidade
5. Direito de ser treinado e acompanhado por pessoas competentes
6. Direito de participar de treinamentos e competições adaptados às suas capacidades
7. Direito de competir com crianças que tenham as mesmas probabilidades de êxito
8. Direito de praticar esportes para sua saúde com toda a segurança e sem doping
9. Direito de ter momentos de descanso
10. Direito de ser ou não um campeão

sábado, 13 de julho de 2019

OAB se une a outras entidades em nota conjunta contra o trabalho infantil

NOTA CONJUNTA
Combater o trabalho infantil é meta prioritária do Estado brasileiro, compromisso assumido não apenas perante o conjunto de seus cidadãos, mas também perante a comunidade internacional. Esse compromisso se estabeleceu desde 1988, com a Constituição Federal, que proibiu o trabalho de crianças e adolescentes e garantiu a eles proteção integral, absoluta e prioritária (artigos 7º, XXXIII e 227 do Texto Constitucional). No mesmo sentido, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e do Adolescente e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Ainda no plano internacional e no âmbito laboral, surgem as Convenções 138 e 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que proíbem o trabalho infantil e alertam para seus diversos malefícios, tendo sido tais instrumentos ratificados pelo Brasil, compondo, assim, seu ordenamento jurídico interno.
A proteção da infância contra o trabalho infantil não é um compromisso aleatório, sem motivações. Estudos e estatísticas diversos demonstram o quão nocivo o trabalho infantil é para a infância e para a adolescência. Entre outros prejuízos, é inegável que: provoca acidentes e adoecimentos, não raras vezes com mutilações e mortes; leva a baixo rendimento e consequente evasão escolar; colabora para a perda da autoestima; afasta a criança do lazer, da brincadeira e do descanso; provoca inversão de papéis com consequências diversas, como uso de drogas, alcoolismo, gravidez precoce e violência; rouba oportunidades; em suma, macula e mata a infância.
Todo ambiente de trabalho, por mais singelo que seja, apresenta diferentes e importantes graus de risco à saúde psicológica e física do trabalhador. Estes riscos são ainda mais pungentes quando se trata de crianças e adolescentes, sujeitos cuja compleição física e psicológica encontra-se em formação. Essa condição precisa ser respeitada, sob pena de sofrerem, por vezes para toda a vida, as consequências gravíssimas decorrentes da exposição precoce ao trabalho. Ainda, a psicologia é uníssona em afirmar que a criança precisa vivenciar a infância plenamente para que se constitua como um adulto saudável, com todas as suas potencialidades desenvolvidas. O trabalho precoce, seja o proibido ou quando desprotegido, indubitavelmente afasta a criança e o adolescente dessa vivência plena.
O fato de haver exemplos de pessoas que foram submetidas a tais práticas sem que consequências diretas ou perceptíveis se apresentem, não elimina a constatação empírica, fática, de que o trabalho antes da idade permitida traz prejuízos de diversas naturezas, não podendo o trabalho nessas condições, em nenhuma medida, ser naturalizado, tolerado ou estimulado.
A comunidade internacional ressoa essas constatações, tanto que o recente acordo firmado entre União Europeia e Mercosul prevê, expressamente, o compromisso de combate ao trabalho infantil. Ainda, a exploração constatada de mão-de-obra infantil afasta o consumidor consciente, que cada vez mais dita as regras tanto no mercado de consumo interno como externo.
Por todas as razões expostas, as instituições abaixo firmadas repudiam quaisquer afirmações que contrariem o intenso trabalho feito pelo Estado brasileiro e suas diversas instituições para proteger a infância contra o trabalho infantil. Pugnam, ainda, por mais abrangente reflexão a respeito do problema, que leve em conta a proteção integral e prioritária garantida a todas as crianças e os adolescentes brasileiros, considerando o seu absoluto direito de serem plenamente respeitados nessa condição especial que ostentam.
Brasília, 5 de julho de 2019.
Ronaldo Curado Fleury
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – MPT
Felipe Santa Cruz
CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
Angelo Fabiano Farias da Costa
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES DO TRABALHO – ANPT
Alessandra Camarano Martins
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS ADVOGADOS TRABALHISTAS – ABRAT
Isa de Oliveira
FORUM NACIONAL DE PREVENÇÃO E ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL – FNPETI

quarta-feira, 5 de junho de 2019

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Thiago Lied, o advogado que ajuda crianças e adolescentes a começarem "Com o Pé Direito"

Desde agosto de 2018, as manhãs de sábado vêm ganhando um novo significado para Thiago Lied, da Assessoria Jurídica do Parque Tecnológico Itaipu (PTI). Por algumas horas, os trajes formais e o “juridiquês” característico da lida profissional são deixados de lado para atender as crianças e adolescentes do projeto “Com o Pé Direito”, do qual faz parte do time de voluntários.
 
O projeto, promovido pela organização não-governamental Advogados pela Infância (criada por Thiago em 2009), tem como objetivo oferecer uma oportunidade para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes socialmente vulneráveis por meio do esporte e de atividades multidisciplinares. “Queremos trabalhar cidadania utilizando o futebol como uma iniciativa educacional”, explica.
 
As atividades acontecem na sede da Associação dos Assistidos da Fundação Itaipu-Brasil (AAFI-BR), na Vila A, sempre das 9h às 11h, começando um café da manhã oferecido por voluntários e comerciantes da cidade, seguido por oficinas temáticas. “Já tivemos atividades sobre Educação Ambiental, compostagem, reciclagem, artes, alimentação saudável, direito das crianças e adolescentes, artesanato, entre outras”, cita.
 
Depois disso é que eles seguem para os campos de futebol, onde são divididos de acordo com a faixa etária, e partem para dribles, chutes e gols. “O esporte tem essa capacidade de mostrar uma direção para as pessoas. Ainda que a criança não se torne um jogador de futebol, pode ter uma vida saudável e conquistar um espaço na sociedade".
 
Mas, para que tudo isso dê certo, Thiago conta com uma verdadeira “seleção” de profissionais com diferentes habilidades. Muitos desses “convocados” são da própria família. “Todo mundo ajuda como pode. Meu irmão Lucas (também colaborador do PTI, da área de Infraestrutura e Obras) foi quem fez a nossa logo, por exemplo, a minha esposa é educadora física, a sogra é enfermeira, etc”, conta. Os quatro meses de projeto já foram suficientes para mostrar que o voluntariado vale a pena. “Depois que começamos o projeto, sentimos que estamos realmente fazendo algo que faz a diferença na vida das pessoas”.
 
Neste começo de ano, as atividades deram uma pausa para o período de férias escolares, mas já devem ser retomadas em fevereiro. Atualmente, cerca de 40 crianças e adolescentes participam do projeto, que tem a expectativa de ser ampliado. “A nossa intenção é que o projeto conquiste cada vez mais o coração das crianças e das famílias. O desejo é que os que estão com a gente continuem e, na medida do possível, tenhamos mais crianças e voluntários”, conta.
 
Se você ficou interessado em participar do projeto “Com o Pé Direito”, seja como voluntário ou realizando doações, esse “time” está com vagas abertas. “Precisamos de ajuda principalmente na parte de oficinas. Todos os sábados queremos trazer temas novos para eles conhecerem. É muito bacana que eles conheçam diferentes profissões, atividades e assuntos”, explica. Mais informações podem ser obtidas com o próprio Thiago, pelo e-mail thiago.lied@pti.org.br.

Fonte: www.pti.org.br

sexta-feira, 29 de junho de 2018

Futebol de Rua: formação cidadã para crianças e adolescentes

Por Catavento, organização integrante da Rede ANDI Brasil no Ceará
Futebol de rua. A primeira imagem que vem a cabeça quando lemos esta expressão são dos jogos de futebol improvisados por crianças onde a rua - ou qualquer outro lugar - vira o campo e as traves são improvisadas com calçados, pedras, tocos de madeira ou o que tiver. Mas para alguns grupos do Nordeste, o futebol de rua é coisa séria. Tanto é que já existe até uma Rede Nordestina de Futebol de Rua.
Para os membros da Rede, o futebol de rua vai além do simples divertimento, é uma oportunidade de formar valores éticos e de direitos humanos nos jogadores. “O esporte é um meio socializador de discussão de problemáticas próprias da juventude”, explica Ciro Santos, professor de educação física do Instituto Formação Centro de Apoio a Educação Básica, localizado no Maranhão. A intenção do Futebol de Rua não é formar atletas, como explica Ciro, mas cidadãos.
Todo o futebol de rua é pensado tendo em vista o bom convívio social dos participantes. No primeiro tempo do jogo, as duas equipes definem as regras da partida de futebol e no final o que definirá o vencedor não são apenas os gols. “Necessariamente, não ganha o jogo quem fez mais gols, mas quem respeitou as regras estabelecidas”, explica Ciro, lembrando do último momento do jogo, quando os participantes discutem os pontos de cada equipe, de acordo com o respeito às regras.
A diferença dessa modalidade para o esporte convencional é notável. Além de não valorizar o esporte como competição, mas como um meio de socialização e de respeito que deve ser construído a partir das regras pensadas pelos times em cada partida, o futebol de rua trabalha com times mistos, com meninos e meninas jogando juntos.
Ciro explica que, no começo, os meninos apresentam resistência a jogar com meninas. “Nós entendemos o futebol, não apenas como um esporte, mas como um bem cultural, que é cheio de preconceitos da nossa cultura, como o de gênero. Nós falamos para os meninos que o esporte é um direito de todos.”
Fabíola Silva, participante do projeto, soube aproveitar esse direito. Ela sempre se interessou por esporte no colégio, e conheceu o futebol de rua através do Projeto Desenvolver. Fabíola, que mora na comunidade de Santa Tereza, em Aracati, município localizado no Vale do Jaguaribe cearense, explica que, diferente de outros grupos, na sua comunidade, não sofreu preconceito dos meninos. “Não foi tanta surpresa pra eles, até porque aqui na comunidade sempre teve mistura de gênero no esporte”, completa.
A jovem viajou para o Chile em uma parceria entre a Rede Nordestina e a Rede Sul-americana de Futebol de Rua. “Amizade, alegria e companheirismo me fizeram ter mais fé no nosso potencial e saber que não importa se ganhamos ou perdemos, o importante é dar a nossa contribuição”, lembra Fabíola de sua experiência em outro país.
Desta experiência, Fabíola explica o que trouxe para seus companheiros de futebol: “Em relação ao que aprendi pretendo repassar para todos e desenvolver atividades como o futebol de rua, que tive o prazer de participar e aprender como jogar um jogo com aspecto diferente, com educação e companheirismo”.

A Rede Nordestina de Futebol de Rua existe desde 2007 e conta com a participação do Maranhão, Piauí, Ceará, Pernambuco, e Paraíba. Para obter mais informações sobre o projeto, clique aqui e acesse o blog da Rede Nordeste de Futebol de Rua  e aqui para conhecer o site da Rede Mundial de Futebol de Rua .
Extraído do site Portal dos Direitos da Criança e do Adolescente.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

OAB emite nota contra redução da maioridade penal

quarta-feira, 25 de outubro de 2017 às 04:24
Brasília - Confira a nota elaborada pelo Conselho Federal da OAB, contra a redução da maioridade penal:
NOTA
A redução da idade penal não erradicará ou reduzirá a grave questão da violência no Brasil. Os dados do Mapa da Violência de 2015 apontam que os adolescentes são as maiores vítimas da violência. Portanto, devem se adotar estratégias sistêmicas de combate às desigualdades sociais e para o aumento dos investimentos públicos em políticas de educação, saúde, esporte, lazer, cultura e assistência social.
A Constituição Federal deu prioridade absoluta a todo um conjunto de medidas protetivas à criança e ao adolescente, estabelecendo como diretriz única no atendimento destes a doutrina da proteção integral, de acordo com o artigo 227º. 
Nesse contexto há ainda inúmeras normas internacionais, bem como a Convenção Sobre os Direitos da Criança e do Adolescente e o Estatuto da Criança e do Adolescente que criam diretrizes nos mesmos rumos. 
A PEC 33/2012 e as propostas a ela apensadas violam a legislação e normativa internacional e os princípios garantidores da dignidade humana de crianças e adolescentes sendo, portanto, inconstitucionais. Violam ainda o princípio da proteção integral por desconsiderar a condição peculiar de desenvolvimento da criança e do adolescente.
O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece responsabilização do adolescente que comete ato infracional com aplicação de medidas socioeducativas, não propõe, portanto, impunidade. As decisões da sociedade não devem jamais desviar a atenção das causas reais de seus problemas. 
O Estatuto da Criança e do Adolescente criou um regime especial em que se reconhece que o adolescente - aquele entre 12 e 17 anos - dispõe de capacidade para responder pelos atos praticados. Entretanto, por meio de um sistema apartado dos adultos e com um paradigma distinto, fundado na proteção integral. Trata-se do sistema socioeducativo. 
Regulamentadas pela Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), as medidas socioeducativas que buscam a responsabilização de adolescente pelo ato praticado, garantem sua integração social e asseguram seus direitos individuais e sociais, superando práticas meramente sancionatórias e disciplinadoras. 
As medidas socioeducativas presentes no SINASE sequer foram implantadas em todos os estados. A superlotação das unidades correcionais é um dos maiores sinais de violação existente atualmente no país, mas não a única. 
Desta forma, a alteração da norma constitucional surtirá efeito danoso e será um grande retrocesso ao Estatuto da Criança e dos Adolescentes.

Conselho Federal da OAB

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Em casos de adoção, decisões do STJ miram o melhor interesse da criança e do adolescente

Adoção. Para a sociedade, um ato de amor. Para o direito brasileiro, um ato jurídico a partir do qual uma criança ou adolescente, não gerado biologicamente pelo adotante, torna-se irrevogavelmente seu filho.
Com a adoção, a criança ou o adolescente passa a ter os mesmos direitos e deveres, inclusive hereditários. Passa a ter o mesmo sobrenome dos adotantes.  Nem mesmo a morte dos adotantes devolve os direitos aos pais biológicos. Para isso, é necessário proceder à nova adoção.
Independentemente do significado, o fato é que, no Brasil, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há 5.624 crianças aptas a serem adotadas. Para cada uma delas há seis adotantes (casais ou pessoas sozinhas) que poderiam ser seus pais (33.633), mas não são.
Desse total, 6% das crianças têm menos de um ano de idade – preferência entre os adotantes -, enquanto 87,42% têm mais de cinco anos. Quanto à raça, 17% são negros, 48,8% pardos, 33,4% brancos, 0,3% pertencem à raça amarela e outros 0,3% são indígenas.
Um processo que sempre foi muito trabalhoso – porque era preciso preencher algumas formalidades e requisitos necessários para habilitar um pretendente -, com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, a adoção ficou mais simples, mais rápida.
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), não é diferente. Processos que discutem questões sobre o tema chegam ao Tribunal da Cidadania frequentemente.  Até abril deste ano, a corte já recebeu cerca de 560 processos sobre a questão.
Adoção à brasileira
A adoção à brasileira se caracteriza “pelo reconhecimento voluntário da maternidade/paternidade, na qual, fugindo das exigências legais pertinentes ao procedimento de adoção, os adotantes simplesmente registram o menor como filho, sem as cautelas judiciais impostas pelo Estado, necessárias à proteção especial que deve recair sobre os interesses da criança”, explicou a ministra Nancy Andrighi em um de seus julgados sobre o tema.
Além de sujeitar o adotante a sanções penais, a adoção informal pode dar margem à suspeita de outros crimes. O STJ, nesses casos, tem julgado “à luz do superior interesse da criança e do adolescente”.
Em um caso recente, a Terceira Turma trouxe a história de um recém-nascido entregue pela mãe biológica adolescente a um casal. A entrega foi intermediada por um advogado, que possivelmente tenha recebido um valor por isso. A mãe biológica também teria ganhado uma quantia pela entrega da filha.
No registro da criança, consta o nome da mãe biológica e do pai adotante, que declarou ser o genitor do bebê. A infante permaneceu com o casal adotante até ser recolhida a um abrigo em virtude da suspeita de tráfico de criança.
O casal recorreu ao STJ pedindo o desabrigamento da criança e a sua guarda provisória. O colegiado negou o pedido, entendendo que não houve ilegalidade no acolhimento institucional da menor.
Padrões éticos
Segundo o relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, mesmo sem a comprovação de que houve pagamento pela criança, ela foi efetivamente negociada pelos envolvidos. O ministro ressaltou que a conduta do casal, que passou por cima das normas legais para alcançar seu objetivo, “coloca em dúvida os seus padrões éticos, tão necessários para a criação de uma criança”.
Ainda com relação à adoção à brasileira, em casos que o pai-adotante busca a nulidade do registro de nascimento, o STJ considera a melhor solução só permitir a anulação quando ainda não tiver sido constituído o vínculo socioafetivo com o adotado.
“Após formado o liame socioafetivo, não poderá o pai-adotante desconstruir a posse do estado de filho que já foi confirmada pelo véu da paternidade socioafetiva. Tal entendimento, todavia, é válido apenas na hipótese de o pai-adotante pretender a nulidade do registro”, afirmou o ministro Massami Uyeda, hoje aposentado.
Adoção unilateral
A adoção unilateral ocorre dentro de uma relação familiar qualquer, em que preexista um vínculo biológico, e o adotante queira se somar ao ascendente biológico nos cuidados com a criança.
O STJ já reconheceu a possibilidade, dentro de uma união estável homoafetiva, de adoção unilateral de filha concebida por inseminação heteróloga, para que ambas as companheiras passem a compartilhar de mães da adotanda.
Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, se determinada situação é possível ao extrato heterossexual da população brasileira, também o é à fração homossexual, assexual ou transexual, e todos os demais grupos representativos de minorias de qualquer natureza.
“O avanço na percepção e alcance dos direitos da personalidade, em linha exclusiva, que equipara, em status jurídico, grupos minoritários como os de orientação homoafetiva aos heterossexuais, traz como corolário necessário a adequação de todo ordenamento infraconstitucional para possibilitar, de um lado, o mais amplo sistema de proteção ao menor e, de outro, a extirpação jurídica dos últimos resquícios de preconceito jurídico”, afirmou a ministra.
O tribunal também já consolidou jurisprudência no sentido de que é possível a adoção sem o consentimento de um dos pais quando a situação fática consolidada no tempo for favorável ao adotando.
O entendimento foi aplicado pela Corte Especial ao homologar sentença estrangeira de adoção baseada no abandono pelo pai de filho que se encontra por anos convivendo em harmonia com padrasto.
Adoção póstuma
Para o STJ, a adoção póstuma pode ser concedida desde que a pessoa falecida tenha demonstrado, em vida, inequívoca vontade de adotar e laço de afetividade com a criança. Em um julgamento ocorrido em 2007 na Terceira Turma, os ministros aplicaram esse entendimento e não atenderam ao pedido das irmãs de um militar que contestavam a decisão da justiça fluminense que admitira o direito à adoção póstuma de uma criança de sete anos.
As irmãs alegaram que o militar não demonstrou em vida a intenção de adotar a menina e que por ser “solteiro, sistemático e agressivo”, além de ter idade avançada (71 anos), o falecido não seria a pessoa indicada para adotar uma criança, oferecendo-lhe um ambiente familiar adequado.
Segundo a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, o tribunal fluminense concluiu, de maneira inequívoca, que houve a manifestação, em vida, da vontade de adotar a criança, tanto que o militar chegou a iniciar o processo de adoção. “O magistrado deve fazer prevalecer os interesses do menor sobre qualquer outro bem ou interesse protegido juridicamente”, assinalou a ministra.
Filiação socioafetiva
A socioafetividade é contemplada pelo artigo 1.593 do Código Civil, no sentido de que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte da consanguinidade ou outra origem”.
O STJ vem entendendo que a paternidade socioafetiva realiza a própria dignidade da pessoa humana por permitir que um indivíduo tenha reconhecido seu histórico de vida e a condição social ostentada, valorizando, além dos aspectos formais, como a regular adoção, a real verdade dos fatos.
Segundo o ministro Villas Bôas Cueva, no julgamento de um recurso que discutia a questão, a vontade clara e inequívoca do pai socioafetivo em ter como seu o filho deve ser convalidada pelas inúmeras manifestações de afeto que demonstram a construção sólida e duradoura de paternidade.
O tribunal tem decidido também que a existência de relação socioafetiva com o pai registral não impede o reconhecimento dos vínculos biológicos quando a investigação de paternidade é demandada por iniciativa do próprio filho.
Baseada no entendimento do ministro relator, Raul Araújo, a decisão estabelece que o pedido se fundamenta no direito personalíssimo, indisponível e imprescritível de conhecimento do estado biológico de filiação, baseado no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
O ministro citou ainda jurisprudência pacífica do STJ, a qual já estabeleceu que, “no contexto da chamada ‘adoção à brasileira’, quando é o filho quem busca a paternidade biológica, não se lhe pode negar esse direito com fundamento na filiação socioafetiva desenvolvida com o pai registral, sobretudo quando este não contesta o pedido”.
CNA
O Cadastro Nacional de Adoção (CNA), ferramenta digital de apoio aos juízes das Varas da Infância e da Juventude na condução dos processos de adoção em todo o País, foi lançado em 2008 pela Corregedoria Nacional de Justiça.
Ao centralizar e cruzar informações, o sistema permite a aproximação entre crianças que aguardam por uma família em abrigos brasileiros e pessoas de todos os Estados que tentam uma adoção. Em março de 2015, o CNA foi reformulado, simplificando operações e possibilitando um cruzamento de dados mais rápido e eficaz.
Com a nova tecnologia, no momento em que um juiz insere os dados de uma criança no sistema, ele é informado automaticamente se há pretendentes na fila de adoção compatíveis com aquele perfil. Isso também acontece se o magistrado cadastra um pretendente e há crianças que atendem às características desejadas.
Os números dos processos não são divulgados em razão de segredo de justiça.
Fonte: Site do STJ. Extraído do Blog Advocacia em Direitos Humanos.

terça-feira, 26 de abril de 2016

Pensão alimentícia conta com maior proteção no novo CPC


A prestação de alimentos, como obrigação de assistência decorrente de relação familiar, com maior ênfase emanada da responsabilidade parental entre pais e filhos, ou de uniões conjugais (casamentos) ou convivenciais (uniões estáveis), tem sido considerada dever jurídico de conduta, cuja relevância oportuniza uma ampla experimentação judiciária a refletir os novos paradigmas advenientes do Código de Processo Civil em plena vigência.
A doutrina e os mais importantes julgados tem sempre compreendido a verba alimentar como satisfação necessária e urgente à dignidade da pessoa do alimentando, de modo a indicar que a obrigação insatisfeita rende consequências graves, convocando, inclusive, as esferas próprias da responsabilização civil ou da responsabilização penal.
Antes, a coercibilidade da prisão civil se apresentava como a única medida inibitória ao implemento das obrigações alimentares pelo cônjuge ou genitor em mora. Agora, com o novo Código de Processo Civil em vigor os alimentos estão mais protegidos, a dignidade do credor alimentário se coloca melhor tutelada e novas medidas processuais inibitórias ao incumprimento da obrigação podem ser implementadas, a tempo instante.
No texto processual anterior, a prisão civil como medida coercitiva, de caráter inibitório, tinha seu lugar de aplicação após decorrido prazo de três meses do inadimplemento da obrigação alimentar (Súmula 309, STJ) e decretada nos termos do parágrafo 1º do artigo 733 do CPC/1973. A todo rigor, a prisão civil nunca se justificou em cobrança de prestações pretéritas, em face da perda de contemporaneidade de seu caráter alimentar, valendo para as três parcelas mais recentes e as ulteriores no curso da execução da dívida. No ponto, o sentido hermenêutico da jurisprudência adotada sempre indicou, outrossim, que essa prisão civil não poderia ser levantada, sem a quitação das demais parcelas vencidas ao tempo da demanda executória.
Imediatidade satisfativa
No texto atual codificado, ajuizada a execução de alimentos imediatamente após o vencimento da dívida, mesmo inexistindo dívida cumulada, ter-se-á ao fim e ao cabo de três dias, a tanto observada a falta de justa causa ao inadimplemento obrigacional dos alimentos, a edição do decreto prisional civil (artigo 528, parágrafo 3º, CPC/2015). A cláusula “o débito alimentar que autoriza a prisão civil é o que compreende até as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução”, constante do parágrafo 7º do artigo 528 do CPC/2015) faz evidenciar que a execução da dívida poderá ser incidente em apenas uma só parcela vencida, diferentemente do alinhado na codificação processual civil de 1973.

Decreto prisional expandido
Diante da imediatidade satisfativa que orienta, na hipótese, uma demanda de execução abreviada, por se permitir fundada apenas em parcela única vencida, impende admitir que, dentro do período de cumprimento da prisão civil, ou seja, no espaço temporal legal preciso e determinado (de um a três meses), em se vencendo novas parcelas, não será necessário a atualização do decreto de prisão civil. Bem certo depender a liberação do devedor da quitação das parcelas obrigacionais que até então tenham vencido ou vencerem, inclusive no período prisional. Ou seja, toda a dívida que for constituída ao tempo do curso do processo, em latitude mais consistente do parágrafo 7º do artigo 528, CPC/2015. Em menos palavras, a prisão civil perdurará, nada obstante tenha sido decretada por valor devedor menor, importando reconhecer que a ruptura do estado prisional dependerá, sim, do pagamento inteiro das parcelas também vencidas enquanto o devedor recolhido em regime fechado no cumprimento da referida prisão civil.

Medidas inibitórias
A coação pessoal da prisão civil chega agora acompanhada de outras medidas inibitórias processuais e tudo desperta interesse, na exata medida que instrumentaliza a efetividade das decisões judiciais alimentares. Vejamos:

1. Protesto do título obrigacional
A ordenação judicial de prestação de alimentos, seja por sentença ou por decisão interlocutória, impõe ao devedor a respectiva obrigação ao adimplemento, sob pena de, em colocando-se em mora, vir a requerimento do credor ser submetido ao processo de cumprimento, na forma do art. 558 do novo CPC/2015.  Isto implica que o executado, em não pagando e em não apresentando uma “justificativa da impossibilidade” que venha a ser aceita pelo juiz da causa, sujeita-se ao pronunciamento judicial dos efeitos da mora alimentar que será imediatamente encaminhado a protesto judicial (artigo 528, parágrafo 7º, CPC/2015)

Para esse novo implemento judiciário, em busca da efetividade do julgado, assinala-se que a providencia de protesto do pronunciamento judicial independerá de requerimento prévio do credor, ou seja, será por ato de oficio; cabendo ao juiz, em tempo imediato ao não reconhecimento de justa causa ao inadimplemento alimentar, determinar o protesto de sua decisão sobre a mora do devedor de alimentos. Por evidente, a providência apresenta-se cogente, não dispondo o magistrado de poder discricionário de não mandar protestar o título obrigacional, para além de a mesma se apresentar cumulativa, isto é, em conjunto com o decreto judicial da prisão civil (artigo 528, c/c o seu parágrafo 3º, CPC).
Registra-se que provimentos administrativos, editados desde a década passada, ou seja, muito antes do novo CPC, buscaram estabelecer medida inibitória ao inadimplemento alimentar, quando orientaram por serem levadas a protesto as decisões judiciais e sentenças determinantes da obrigação de prestar alimentos.
Neste sentido, o Provimento 3/2008, de 11 de setembro de 2008, do Conselho da Magistratura de Pernambuco, por nossa iniciativa enquanto Presidente do Tribunal de Justiça estadual, colocou-se como normativo pioneiro, ao dispor sobre o protesto de decisões acerca de alimentos provisórios ou provisionais e de sentença transitada em julgado, em sede de ação de alimentos (DPJ-PE, de 17.09.2008), ditando as providências administrativas de protesto, independente de execução das decisões judiciais inadimplidas. A melhor doutrina festejou à época, refletindo com destaque:
“[…] Tão coercitiva quanto a própria prisão civil, o devedor tem de ser constrangido ao pagamento do débito. Caminha-se para o protesto do débito alimentar, que nada tem de ilegal. Em Pernambuco, objeto do Provimento 3/2008, do Tribunal de Justiça daquele Estado. Até porque, se qualquer execução aparelhada pode gerar providência dessa ordem – as execuções, em São Paulo, são comunicadas on line à Serasa e devidamente anotadas, há convênio com o Tribunal de Justiça para tanto. (YUSSEF SAID CAHALI, “Dos alimentos”, 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 729 e 730).
A iniciativa paradigma serviu de mecanismo indutor à efetividade das decisões judiciais em matéria alimentar e inspira, por certo, a medida de coercibilidade incluída no texto do novo Código de Processo Civil de 2015, agora extraída do próprio processo judicial e por iniciativa do juiz, sem necessidade de provocação da parte credora. Mais. Provimentos de Corregedorias Gerais de Justiça estaduais seguiram o Provimento nº 03/2008 – CM-PE, suficiente indicando-se o Provimento nº 08/2009, de 03.06.2009, da CGJ-GO, adiante reconhecido em sua legalidade pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no PP nº 200910000041784; e os Provimentos de nº 03/2010, de 09.06.2010, da CGJ-MA; de nº 52/2010, de 16.12.2010, da CGJ-MS; de nº 24/2012, de 24.08.2012, da CGJ-ES; e de nº 01/2014, de 14.04.2014, da CGJ-CE; todos dispondo sobre o protesto de decisões judiciais em ações de alimentos.
No mais, a nova disposição processual (art. 528, par. 1º, CPC/2015), já carrega consigo o reconhecimento jurisdicional maior de sua legalidade, desde o acórdão paradigma seguinte:
“Apelação Cível. Ação ordinária de sustação de protesto. (...) 4. É possível o protesto da sentença condenatória, transitada em julgado, que represente obrigação pecuniária líquida, certa e exigível. 5. Quem não cumpre espontaneamente a decisão judicial não pode reclamar porque a respectiva sentença foi levada a protesto." (STJ, 3ª Turma, RESP. 750805, Rel. Min. Humberto Gomes de barros, julgado em 16.06.2009).
Adiante, o tema foi consolidado no Recurso Especial nº 1.533.206-MG, da Relatoria do Min. Luís Felipe Salomão, com referência expressa ao pioneiro Provimento nº 03/2008 do Conselho da Magistratura de Pernambuco.
1.1. Protesto como medida prefacial. Em leitura do ditame do artigo 528, parágrafo 1º, do CPC/2015, observe-se que o primeiro ato de coercibilidade ao devedor inadimplente é o de o pronunciamento judicial de sua mora injustificada ser levado, de imediato, a protesto. Medida ordenada pelo juiz, de ofício. Essa determinação antecede, na sequência legal do art. 258, CPC/15, o próprio decreto de prisão civil, que vem referido somente em parágrafo 3º ao mesmo dispositivo. Induvidoso que, a todo rigor, as medidas embora cumulativas não precisarão, em princípio, serem concorrentes em tempo único, ou seja, serem tomadas a um só tempo. Nada impede por pragmática processual e busca mais eficaz de concretude decisória, que a ordem de protesto seja levada a efeito sob primeira providencia, sequenciando-se, em tempo próprio e adequado, o decreto de prisão civil, caso o devedor não pague em cartório a dívida alimentar existente.
2. Configuração de abandono material
Uma segunda medida inibitória processual que se apresenta a contribuir, preventivamente, para a efetividade da prestação jurisdicional é, sem dúvida, a possibilidade já demarcada no novo Código de Processo Civil de o juiz, verificada a conduta procrastinatória do executado, assim entendendo conforme as circunstancias fáticas, dar ciência ao Ministério Público dos indícios da prática do crime de abandono material (artigo 532, CPC/2015).

Convém admitir que a cláusula “conduta procrastinatória” apresenta-se, no caso em espécie, de conceito juridicamente indeterminado, porquanto tanto poderá ter lugar no curso do processo judicial como, sobretudo, pode operar-se em fatos precedentes que terminaram, iniludivelmente, por obrigar o credor a demandar a execução de alimentos ante a desídia daquele obrigado à devida proteção material. Atente-se, no particular, que o crime de abandono material (artigo 244, Código Penal), “é omissivo próprio e se consuma quando o devedor, deixa de prover a subsistência de seus filhos menores não lhes proporcionando os recursos necessários. Portanto, o que a lei pune é o deixar de prover a subsistência da família e, não, o prover insuficientemente”. De todo o seu conduto, a novel disposição do CPC atende, com maior latitude, ao caso concreto, a mesma disposição já contida no artigo 40 Código de Processo Penal.
Logo, em face de ambos os dispositivos, é de se assinalar, sem novidade, que a situação concreta ditará a aplicação pertinente da medida processual que se impõe na espécie. Todavia, consabidamente, o novo ditado da lei processual mais obriga o juiz a refletir, a cada caso, as eventuais hipóteses de abandono material diante da falta imotivada da prestação de alimentos.
3. Hipoteca judiciária
Em sede de pensão de alimentos componente de indenizações por ato ilícito, dispõe o parágrafo 2o do artigo 533 d novo CPC que o juiz poderá substituir a constituição do capital pela inclusão do exequente em folha de pagamento de pessoa jurídica de notória capacidade econômica ou, a requerimento do executado, por fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz. Tais providencias estão prestativas a inibir eventual inadimplência alimentar e melhor protegem os alimentos devidos. Representa uma das medidas inibitórias ao incumprimento da obrigação.

Diferente da penhora, onde a execução ocorre por dívida vencida e o devedor nomeia os bens, com ordem de preferência, a hipoteca é benefício legal em favor do vencedor em ação condenatória, servindo de garantia ao adimplemento da obrigação. A hipoteca independe de pedido do credor, deve ter sua inscrição determinada pelo juiz, por mero despacho, com registro junto à matrícula de bem imóvel do devedor. Não exige, sequer, qualquer procedimento, inclusive o da especialização, reservado apenas à hipoteca legal.
De origem francesa, e introduzida no direito processual brasileiro, por inspiração do art. 676 do Código de Processo Civil português, a hipoteca judiciária tem por pressuposto a existência de uma sentença condenatória; valendo considerar que a imposição do gravame judicial é imediata, ainda que pendente recurso com efeito suspensivo (RT 596/1999).
Assim, a hipoteca judiciária, que se produz fundada pela condenação e surge como efeito imediato e anexo da própria sentença condenatória, assume nos processos de família, importante mecanismo garantidor do julgado. Recolha-se um exemplo: aquele obrigado a prestar alimentos, terá parcela de seu patrimônio imobiliário afetado pela hipoteca, certo que necessário grava-lo no alcance de garantir o cumprimento efetivo da obrigação. A hipoteca devidamente inscrita assegura, em seu fim específico, uma futura e eventual penhora, como eficaz garantia da execução da obrigação alimentar acaso insatisfeita. Trata-se, portanto, de instrumento preventivo de salvaguarda aos interesses do credor, posto à sua disposição.
De fato. A inscrição da hipoteca judiciária, nos processos de família, é de providência objetiva para a sentença obter em sua eficácia, comando de melhor operosidade. Neste sentido, é inegável que o instituto reclama ser melhor aproveitado. Designadamente, a partir das medidas inibitórias processuais que aqui se apresentam, o novo estatuto processual civil coloca-se a melhor servir os alimentos a quem deles precisa. ­­­­­­­­
Jones Figueirêdo Alves é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), onde coordena a Comissão de Magistratura de Família.

Revista Consultor Jurídico, 17 de abril de 2016, 12h58
Extraído do blog Advocacia em Direitos Humanos

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Proteção internacional do direito à vida de crianças e adolescentes


Todos os tratados internacionais que versem sobre direitos humanos, firmados e ratificados pelo Brasil, trazem normas que podem e devem ser utilizadas para incrementar a proteção e a promoção dos direitos de crianças e de adolescentes. Assim preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ao dizer em seu art. 3°: A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.

O entendimento é reforçado pelo disposto na Constituição Federal, art. 5°, § 2°: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes (...) dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Destarte, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU (Organização das Nações Unidas), promulgada em 1948, garante o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal a todo ser humano (artigo III). O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de 1966, da mesma forma, garante o direito à vida, dizendo que ele é inerente à pessoa humana; que deve ser protegido pela lei e que ninguém pode dele ser arbitrariamente privado.

O direito à vida também é previsto pela Convenção Americana dos Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), de 1969, em seu artigo 4°, item 1, em termos muito semelhantes aos do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, enunciados no parágrafo anterior.

No que tange à proteção especial à criança e ao adolescente, deve ser dito que ela remonta ao texto da Declaração de Genebra sobre os Direitos da Criança, de 1924; passa pelo construído da Declaração dos Direitos da Criança, de 1959; e pelas disposições dos Pactos Internacionais dos Direitos Civis e Políticos (artigo 24, item 1) e dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (artigo 10, item 3), ambos de 1966; tem reconhecimento na Convenção Americana dos Direitos Humanos (artigo 19); de igual maneira, em seu Protocolo Adicional em matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (artigo 16), o qual dispõe inclusive que a criança tem o direito de crescer, ou seja, de se desenvolver plenamente[1]; e culmina com a Convenção dos Direitos da Criança, de 1989.

Essa, por sua vez, traz a seguinte disposição acerca do direito à vida:

Artigo 6
1. Os Estados Partes reconhecem que toda criança[2] tem o direito inerente à vida.
2. Os Estados Partes assegurarão ao máximo a sobrevivência e o desenvolvimento da criança.

Em 2003[3], o Governo brasileiro, em cumprimento ao artigo 44 da Convenção, encaminhou relatório consolidado ao Comitê para os Direitos da Criança da ONU, a fim de que este examinasse os progressos realizados pelo país no cumprimento das obrigações contraídas. O documento[4] dizia que

Em relação especificamente à vida e à sobrevivência, o Estatuto dispõe, em seu artigo 7º, que “a criança e o adolescente têm direito à proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência".
A plena efetivação desses direitos encontra ainda sérios obstáculos na realidade brasileira. A despeito da mudança cultural que vem ocorrendo, no sentido de focalizar a criança e o adolescente como seres em desenvolvimento e sujeitos de direito, bem como de uma legislação avançada, voltada para sua proteção e do muito que vem sendo feito pelo Governo e pela sociedade, o cumprimento efetivo desse princípio permanece ainda longe de ser totalmente alcançado.
As condições de vida de grande número de crianças e adolescentes são marcadas pela pobreza, pelas dificuldades de acesso e deficiências na qualidade dos serviços públicos, pelo trabalho precoce e pela exposição a situações de violência.

O relatório faz referência ao Estatuto da Criança e do Adolescente que, assim como a Constituição da República (art. 227), está em perfeita concordância com o texto da Convenção dos Direitos da Criança (CDC), no que se refere ao direito à vida e a todos os demais direitos de crianças e adolescentes. Reconhece, no entanto, a enorme distância entre normatização e efetividade da mesma. Os relatórios alternativos elaborados pela sociedade organizada apontam o problema do grande número de homicídios cometidos contra adolescentes no Brasil[5].

Como resposta, o Comitê recomendou ao país

priorizar medidas necessárias para impedir este tipo de crime, investigar cada um dos assassinatos, responsabilizar os criminosos e fornecer o apoio adequado às famílias das vítimas. O Comitê solicitou ainda que o governo brasileiro informe, em seu próximo relatório à ONU, o número de crimes deste tipo praticados contra crianças e adolescentes e denunciados às autoridades competentes, a quantidade que resultou em sentença e qual a natureza desta[6].

Cabe ressaltar que o sistema de proteção internacional dos direitos humanos possui mecanismos para incentivar e exigir o cumprimento por parte dos Estados das normas constantes dos tratados aos quais livremente aderiram. No caso do sistema especial de proteção dos direitos das crianças - representado pela CDC -, a única medida de controle do cumprimento do tratado é a obrigação de apresentar relatórios periódicos ao Comitê para os Direitos da Criança, o qual poderá fazer sugestões e recomendações. O peso político dessas recomendações deve, portanto, ser bem explorado pelas organizações da sociedade que realizam o monitoramento das ações estatais.

De igual forma, pode-se apelar ao sistema regional interamericano de proteção dos direitos humanos, consubstanciado no Pacto de San José da Costa Rica. Esse documento prevê outras medidas de exigibilidade de seu conteúdo, quais sejam a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana[7]. A Comissão recebe petições de qualquer pessoa ou grupos de pessoas ou de entidades não governamentais, que com tenham denúncias ou queixas de violação da Convenção por um Estado-parte (artigo 44). Após analisar o caso e recomendar providências ao Estado-parte violador, em não sendo cumpridas, pode encaminhar a questão para a Corte Interamericana. Essa recebe reclamações oriundas somente da Comissão ou diretamente dos Estados-partes (artigo 61). A sentença condenatória da Corte corresponde a título executivo judicial contra o Estado onde ocorreu a violação de direito (artigo 68, 2).

Em que pesem as dificuldades, segundo especialistas, são boas as perspectivas de efetivação das normas de direito internacional.

(Trecho adaptado de artigo intitulado "Homicídios contra adolescentes e sistema internacional de proteção dos direitos humanos: a problemática iguaçuense", de autoria de Thiago Borges Lied e apresentado no VI Jurisciência – Mostra Jurídica da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) -, realizado em Foz do Iguaçu, entre 6 e 8 de outubro de 2010)



[1] O direito ao desenvolvimento é mais bem explicitado na Declaração do Direito ao Desenvolvimento, de 1986, da ONU. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/spovos/lex170a.htm>. Acesso em: 23 ago 2010.
[2] Criança para a Convenção é todo o indivíduo com menos de 18 anos (artigo 1).
[3] O último relatório foi entregue pelo governo brasileiro em setembro de 2015. Confira também o relatório alternativo apresentado por entidades e movimentos sociais de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes: http://www.anced.org.br/wp-content/uploads/2014/05/Relat%C3%B3rio-Alternativo-CDC-2004-2012.pdf.  
[4] Disponível em: <http://www.andi.org.br/informes/Relatorio_DCA.pdf>. Acesso em: 10 ago 2010.
[5] Ver II Relatório Alternativo sobre os Direitos da Criança, produzido pela ANCED – Associação Nacional dos Centros de Defesa das Crianças e dos Adolescentes. Disponível em: <http://www.anced.org.br.. Acesso em 23 ago 2010.
[6] Ver notícia “ONU apresenta recomendações para o Brasil cumprir os direitos das crianças e adolescentes”. Disponível em: <http://www.andi.org.br/noticias/templates/template_dca.asp?articleid=5142&zoneid=257>. Acesso em: 23 ago 2010.
[7] Para mais detalhes, ver PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e justiça internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 85-118.


sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Mantidas obrigações a escolas particulares previstas no Estatuto da Pessoa com Deficiência


O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu medida cautelar na Ação de Inconstitucionalidade (ADI) 5357, ajuizada pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen) contra dispositivos do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) que tratam de obrigações dirigidas às escolas particulares.

A Confederação requeria a suspensão da eficácia do parágrafo primeiro do artigo 28 e caput do artigo 30 da norma, que estabelecem a obrigatoriedade de as escolas privadas promoverem a inserção de pessoas com deficiência no ensino regular e prover as medidas de adaptação necessárias sem que ônus financeiro seja repassado às mensalidades, anuidades e matrículas.
Para a Confenen, a norma estabelece medidas de alto custo econômico para as escolas privadas, violando vários dispositivos constitucionais, entre eles o artigo 208, inciso III, que prevê como dever do Estado o atendimento educacional aos deficientes.
Em sua decisão, o ministro Edson Fachin explicou que diversos dispositivos da Constituição Federal, bem como a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro com status equivalente ao de emenda constitucional (rito previsto no parágrafo 3º do artigo 5º da Constituição), dispõem sobre a proteção da pessoa deficiente. Para o ministro, “ao menos neste momento processual”, a lei impugnada atendeu ao compromisso constitucional e internacional de proteção e ampliação progressiva dos direitos fundamentais e humanos das pessoas com deficiência.
“Se é certo que se prevê como dever do Estado facilitar às pessoas com deficiência sua plena e igual participação no sistema de ensino e na vida em comunidade, bem como, de outro lado, a necessária disponibilização do ensino primário gratuito e compulsório, é igualmente certo inexistir qualquer limitação da educação das pessoas com deficiência a estabelecimentos públicos ou privados que prestem o serviço público educacional”, afirmou o ministro.
Apesar de o serviço público de educação ser livre à inciativa privada, ressaltou o relator, “não significa que os agentes econômicos que o prestam possam fazê-lo de forma ilimitada ou sem responsabilidade”. Ele explicou que a autorização e avaliação de qualidade do serviço é realizada pelo Poder Público, bem como é necessário o cumprimento das normas gerais de educação previstas, inclusive, na própria Constituição.
“Tais requisitos [inclusão das pessoas com deficiência], por mandamento constitucional, aplicam-se a todos os agentes econômicos, de modo que há verdadeiro perigo inverso na concessão da cautelar. Corre-se o risco de se criar às instituições particulares de ensino odioso privilégio do qual não se podem furtar os demais agentes econômicos. Privilégio odioso porque oficializa a discriminação”, afirmou o ministro em sua decisão.
Sobre os prejuízos econômicos alegados pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, o ministro disse que a Lei 13.146/2015 foi publicada em 7/7/2015 e estabeleceu prazo de 180 dias para entrar em vigor (janeiro de 2016), o que afastaria a pretensão acautelatória.
Dessa forma, o ministro Edson Fachin indeferiu a medida cautelar, por entender ausentes a plausibilidade jurídico do pedido e o perigo da demora. A decisão será submetida a referendo pelo Plenário do STF.
FS/AD
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ADI 5357

Fonte: www.stf.jus.br