quarta-feira, 8 de junho de 2016

Em casos de adoção, decisões do STJ miram o melhor interesse da criança e do adolescente

Adoção. Para a sociedade, um ato de amor. Para o direito brasileiro, um ato jurídico a partir do qual uma criança ou adolescente, não gerado biologicamente pelo adotante, torna-se irrevogavelmente seu filho.
Com a adoção, a criança ou o adolescente passa a ter os mesmos direitos e deveres, inclusive hereditários. Passa a ter o mesmo sobrenome dos adotantes.  Nem mesmo a morte dos adotantes devolve os direitos aos pais biológicos. Para isso, é necessário proceder à nova adoção.
Independentemente do significado, o fato é que, no Brasil, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há 5.624 crianças aptas a serem adotadas. Para cada uma delas há seis adotantes (casais ou pessoas sozinhas) que poderiam ser seus pais (33.633), mas não são.
Desse total, 6% das crianças têm menos de um ano de idade – preferência entre os adotantes -, enquanto 87,42% têm mais de cinco anos. Quanto à raça, 17% são negros, 48,8% pardos, 33,4% brancos, 0,3% pertencem à raça amarela e outros 0,3% são indígenas.
Um processo que sempre foi muito trabalhoso – porque era preciso preencher algumas formalidades e requisitos necessários para habilitar um pretendente -, com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, a adoção ficou mais simples, mais rápida.
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), não é diferente. Processos que discutem questões sobre o tema chegam ao Tribunal da Cidadania frequentemente.  Até abril deste ano, a corte já recebeu cerca de 560 processos sobre a questão.
Adoção à brasileira
A adoção à brasileira se caracteriza “pelo reconhecimento voluntário da maternidade/paternidade, na qual, fugindo das exigências legais pertinentes ao procedimento de adoção, os adotantes simplesmente registram o menor como filho, sem as cautelas judiciais impostas pelo Estado, necessárias à proteção especial que deve recair sobre os interesses da criança”, explicou a ministra Nancy Andrighi em um de seus julgados sobre o tema.
Além de sujeitar o adotante a sanções penais, a adoção informal pode dar margem à suspeita de outros crimes. O STJ, nesses casos, tem julgado “à luz do superior interesse da criança e do adolescente”.
Em um caso recente, a Terceira Turma trouxe a história de um recém-nascido entregue pela mãe biológica adolescente a um casal. A entrega foi intermediada por um advogado, que possivelmente tenha recebido um valor por isso. A mãe biológica também teria ganhado uma quantia pela entrega da filha.
No registro da criança, consta o nome da mãe biológica e do pai adotante, que declarou ser o genitor do bebê. A infante permaneceu com o casal adotante até ser recolhida a um abrigo em virtude da suspeita de tráfico de criança.
O casal recorreu ao STJ pedindo o desabrigamento da criança e a sua guarda provisória. O colegiado negou o pedido, entendendo que não houve ilegalidade no acolhimento institucional da menor.
Padrões éticos
Segundo o relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, mesmo sem a comprovação de que houve pagamento pela criança, ela foi efetivamente negociada pelos envolvidos. O ministro ressaltou que a conduta do casal, que passou por cima das normas legais para alcançar seu objetivo, “coloca em dúvida os seus padrões éticos, tão necessários para a criação de uma criança”.
Ainda com relação à adoção à brasileira, em casos que o pai-adotante busca a nulidade do registro de nascimento, o STJ considera a melhor solução só permitir a anulação quando ainda não tiver sido constituído o vínculo socioafetivo com o adotado.
“Após formado o liame socioafetivo, não poderá o pai-adotante desconstruir a posse do estado de filho que já foi confirmada pelo véu da paternidade socioafetiva. Tal entendimento, todavia, é válido apenas na hipótese de o pai-adotante pretender a nulidade do registro”, afirmou o ministro Massami Uyeda, hoje aposentado.
Adoção unilateral
A adoção unilateral ocorre dentro de uma relação familiar qualquer, em que preexista um vínculo biológico, e o adotante queira se somar ao ascendente biológico nos cuidados com a criança.
O STJ já reconheceu a possibilidade, dentro de uma união estável homoafetiva, de adoção unilateral de filha concebida por inseminação heteróloga, para que ambas as companheiras passem a compartilhar de mães da adotanda.
Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, se determinada situação é possível ao extrato heterossexual da população brasileira, também o é à fração homossexual, assexual ou transexual, e todos os demais grupos representativos de minorias de qualquer natureza.
“O avanço na percepção e alcance dos direitos da personalidade, em linha exclusiva, que equipara, em status jurídico, grupos minoritários como os de orientação homoafetiva aos heterossexuais, traz como corolário necessário a adequação de todo ordenamento infraconstitucional para possibilitar, de um lado, o mais amplo sistema de proteção ao menor e, de outro, a extirpação jurídica dos últimos resquícios de preconceito jurídico”, afirmou a ministra.
O tribunal também já consolidou jurisprudência no sentido de que é possível a adoção sem o consentimento de um dos pais quando a situação fática consolidada no tempo for favorável ao adotando.
O entendimento foi aplicado pela Corte Especial ao homologar sentença estrangeira de adoção baseada no abandono pelo pai de filho que se encontra por anos convivendo em harmonia com padrasto.
Adoção póstuma
Para o STJ, a adoção póstuma pode ser concedida desde que a pessoa falecida tenha demonstrado, em vida, inequívoca vontade de adotar e laço de afetividade com a criança. Em um julgamento ocorrido em 2007 na Terceira Turma, os ministros aplicaram esse entendimento e não atenderam ao pedido das irmãs de um militar que contestavam a decisão da justiça fluminense que admitira o direito à adoção póstuma de uma criança de sete anos.
As irmãs alegaram que o militar não demonstrou em vida a intenção de adotar a menina e que por ser “solteiro, sistemático e agressivo”, além de ter idade avançada (71 anos), o falecido não seria a pessoa indicada para adotar uma criança, oferecendo-lhe um ambiente familiar adequado.
Segundo a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, o tribunal fluminense concluiu, de maneira inequívoca, que houve a manifestação, em vida, da vontade de adotar a criança, tanto que o militar chegou a iniciar o processo de adoção. “O magistrado deve fazer prevalecer os interesses do menor sobre qualquer outro bem ou interesse protegido juridicamente”, assinalou a ministra.
Filiação socioafetiva
A socioafetividade é contemplada pelo artigo 1.593 do Código Civil, no sentido de que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte da consanguinidade ou outra origem”.
O STJ vem entendendo que a paternidade socioafetiva realiza a própria dignidade da pessoa humana por permitir que um indivíduo tenha reconhecido seu histórico de vida e a condição social ostentada, valorizando, além dos aspectos formais, como a regular adoção, a real verdade dos fatos.
Segundo o ministro Villas Bôas Cueva, no julgamento de um recurso que discutia a questão, a vontade clara e inequívoca do pai socioafetivo em ter como seu o filho deve ser convalidada pelas inúmeras manifestações de afeto que demonstram a construção sólida e duradoura de paternidade.
O tribunal tem decidido também que a existência de relação socioafetiva com o pai registral não impede o reconhecimento dos vínculos biológicos quando a investigação de paternidade é demandada por iniciativa do próprio filho.
Baseada no entendimento do ministro relator, Raul Araújo, a decisão estabelece que o pedido se fundamenta no direito personalíssimo, indisponível e imprescritível de conhecimento do estado biológico de filiação, baseado no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
O ministro citou ainda jurisprudência pacífica do STJ, a qual já estabeleceu que, “no contexto da chamada ‘adoção à brasileira’, quando é o filho quem busca a paternidade biológica, não se lhe pode negar esse direito com fundamento na filiação socioafetiva desenvolvida com o pai registral, sobretudo quando este não contesta o pedido”.
CNA
O Cadastro Nacional de Adoção (CNA), ferramenta digital de apoio aos juízes das Varas da Infância e da Juventude na condução dos processos de adoção em todo o País, foi lançado em 2008 pela Corregedoria Nacional de Justiça.
Ao centralizar e cruzar informações, o sistema permite a aproximação entre crianças que aguardam por uma família em abrigos brasileiros e pessoas de todos os Estados que tentam uma adoção. Em março de 2015, o CNA foi reformulado, simplificando operações e possibilitando um cruzamento de dados mais rápido e eficaz.
Com a nova tecnologia, no momento em que um juiz insere os dados de uma criança no sistema, ele é informado automaticamente se há pretendentes na fila de adoção compatíveis com aquele perfil. Isso também acontece se o magistrado cadastra um pretendente e há crianças que atendem às características desejadas.
Os números dos processos não são divulgados em razão de segredo de justiça.
Fonte: Site do STJ. Extraído do Blog Advocacia em Direitos Humanos.

terça-feira, 26 de abril de 2016

Pensão alimentícia conta com maior proteção no novo CPC


A prestação de alimentos, como obrigação de assistência decorrente de relação familiar, com maior ênfase emanada da responsabilidade parental entre pais e filhos, ou de uniões conjugais (casamentos) ou convivenciais (uniões estáveis), tem sido considerada dever jurídico de conduta, cuja relevância oportuniza uma ampla experimentação judiciária a refletir os novos paradigmas advenientes do Código de Processo Civil em plena vigência.
A doutrina e os mais importantes julgados tem sempre compreendido a verba alimentar como satisfação necessária e urgente à dignidade da pessoa do alimentando, de modo a indicar que a obrigação insatisfeita rende consequências graves, convocando, inclusive, as esferas próprias da responsabilização civil ou da responsabilização penal.
Antes, a coercibilidade da prisão civil se apresentava como a única medida inibitória ao implemento das obrigações alimentares pelo cônjuge ou genitor em mora. Agora, com o novo Código de Processo Civil em vigor os alimentos estão mais protegidos, a dignidade do credor alimentário se coloca melhor tutelada e novas medidas processuais inibitórias ao incumprimento da obrigação podem ser implementadas, a tempo instante.
No texto processual anterior, a prisão civil como medida coercitiva, de caráter inibitório, tinha seu lugar de aplicação após decorrido prazo de três meses do inadimplemento da obrigação alimentar (Súmula 309, STJ) e decretada nos termos do parágrafo 1º do artigo 733 do CPC/1973. A todo rigor, a prisão civil nunca se justificou em cobrança de prestações pretéritas, em face da perda de contemporaneidade de seu caráter alimentar, valendo para as três parcelas mais recentes e as ulteriores no curso da execução da dívida. No ponto, o sentido hermenêutico da jurisprudência adotada sempre indicou, outrossim, que essa prisão civil não poderia ser levantada, sem a quitação das demais parcelas vencidas ao tempo da demanda executória.
Imediatidade satisfativa
No texto atual codificado, ajuizada a execução de alimentos imediatamente após o vencimento da dívida, mesmo inexistindo dívida cumulada, ter-se-á ao fim e ao cabo de três dias, a tanto observada a falta de justa causa ao inadimplemento obrigacional dos alimentos, a edição do decreto prisional civil (artigo 528, parágrafo 3º, CPC/2015). A cláusula “o débito alimentar que autoriza a prisão civil é o que compreende até as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução”, constante do parágrafo 7º do artigo 528 do CPC/2015) faz evidenciar que a execução da dívida poderá ser incidente em apenas uma só parcela vencida, diferentemente do alinhado na codificação processual civil de 1973.

Decreto prisional expandido
Diante da imediatidade satisfativa que orienta, na hipótese, uma demanda de execução abreviada, por se permitir fundada apenas em parcela única vencida, impende admitir que, dentro do período de cumprimento da prisão civil, ou seja, no espaço temporal legal preciso e determinado (de um a três meses), em se vencendo novas parcelas, não será necessário a atualização do decreto de prisão civil. Bem certo depender a liberação do devedor da quitação das parcelas obrigacionais que até então tenham vencido ou vencerem, inclusive no período prisional. Ou seja, toda a dívida que for constituída ao tempo do curso do processo, em latitude mais consistente do parágrafo 7º do artigo 528, CPC/2015. Em menos palavras, a prisão civil perdurará, nada obstante tenha sido decretada por valor devedor menor, importando reconhecer que a ruptura do estado prisional dependerá, sim, do pagamento inteiro das parcelas também vencidas enquanto o devedor recolhido em regime fechado no cumprimento da referida prisão civil.

Medidas inibitórias
A coação pessoal da prisão civil chega agora acompanhada de outras medidas inibitórias processuais e tudo desperta interesse, na exata medida que instrumentaliza a efetividade das decisões judiciais alimentares. Vejamos:

1. Protesto do título obrigacional
A ordenação judicial de prestação de alimentos, seja por sentença ou por decisão interlocutória, impõe ao devedor a respectiva obrigação ao adimplemento, sob pena de, em colocando-se em mora, vir a requerimento do credor ser submetido ao processo de cumprimento, na forma do art. 558 do novo CPC/2015.  Isto implica que o executado, em não pagando e em não apresentando uma “justificativa da impossibilidade” que venha a ser aceita pelo juiz da causa, sujeita-se ao pronunciamento judicial dos efeitos da mora alimentar que será imediatamente encaminhado a protesto judicial (artigo 528, parágrafo 7º, CPC/2015)

Para esse novo implemento judiciário, em busca da efetividade do julgado, assinala-se que a providencia de protesto do pronunciamento judicial independerá de requerimento prévio do credor, ou seja, será por ato de oficio; cabendo ao juiz, em tempo imediato ao não reconhecimento de justa causa ao inadimplemento alimentar, determinar o protesto de sua decisão sobre a mora do devedor de alimentos. Por evidente, a providência apresenta-se cogente, não dispondo o magistrado de poder discricionário de não mandar protestar o título obrigacional, para além de a mesma se apresentar cumulativa, isto é, em conjunto com o decreto judicial da prisão civil (artigo 528, c/c o seu parágrafo 3º, CPC).
Registra-se que provimentos administrativos, editados desde a década passada, ou seja, muito antes do novo CPC, buscaram estabelecer medida inibitória ao inadimplemento alimentar, quando orientaram por serem levadas a protesto as decisões judiciais e sentenças determinantes da obrigação de prestar alimentos.
Neste sentido, o Provimento 3/2008, de 11 de setembro de 2008, do Conselho da Magistratura de Pernambuco, por nossa iniciativa enquanto Presidente do Tribunal de Justiça estadual, colocou-se como normativo pioneiro, ao dispor sobre o protesto de decisões acerca de alimentos provisórios ou provisionais e de sentença transitada em julgado, em sede de ação de alimentos (DPJ-PE, de 17.09.2008), ditando as providências administrativas de protesto, independente de execução das decisões judiciais inadimplidas. A melhor doutrina festejou à época, refletindo com destaque:
“[…] Tão coercitiva quanto a própria prisão civil, o devedor tem de ser constrangido ao pagamento do débito. Caminha-se para o protesto do débito alimentar, que nada tem de ilegal. Em Pernambuco, objeto do Provimento 3/2008, do Tribunal de Justiça daquele Estado. Até porque, se qualquer execução aparelhada pode gerar providência dessa ordem – as execuções, em São Paulo, são comunicadas on line à Serasa e devidamente anotadas, há convênio com o Tribunal de Justiça para tanto. (YUSSEF SAID CAHALI, “Dos alimentos”, 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 729 e 730).
A iniciativa paradigma serviu de mecanismo indutor à efetividade das decisões judiciais em matéria alimentar e inspira, por certo, a medida de coercibilidade incluída no texto do novo Código de Processo Civil de 2015, agora extraída do próprio processo judicial e por iniciativa do juiz, sem necessidade de provocação da parte credora. Mais. Provimentos de Corregedorias Gerais de Justiça estaduais seguiram o Provimento nº 03/2008 – CM-PE, suficiente indicando-se o Provimento nº 08/2009, de 03.06.2009, da CGJ-GO, adiante reconhecido em sua legalidade pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no PP nº 200910000041784; e os Provimentos de nº 03/2010, de 09.06.2010, da CGJ-MA; de nº 52/2010, de 16.12.2010, da CGJ-MS; de nº 24/2012, de 24.08.2012, da CGJ-ES; e de nº 01/2014, de 14.04.2014, da CGJ-CE; todos dispondo sobre o protesto de decisões judiciais em ações de alimentos.
No mais, a nova disposição processual (art. 528, par. 1º, CPC/2015), já carrega consigo o reconhecimento jurisdicional maior de sua legalidade, desde o acórdão paradigma seguinte:
“Apelação Cível. Ação ordinária de sustação de protesto. (...) 4. É possível o protesto da sentença condenatória, transitada em julgado, que represente obrigação pecuniária líquida, certa e exigível. 5. Quem não cumpre espontaneamente a decisão judicial não pode reclamar porque a respectiva sentença foi levada a protesto." (STJ, 3ª Turma, RESP. 750805, Rel. Min. Humberto Gomes de barros, julgado em 16.06.2009).
Adiante, o tema foi consolidado no Recurso Especial nº 1.533.206-MG, da Relatoria do Min. Luís Felipe Salomão, com referência expressa ao pioneiro Provimento nº 03/2008 do Conselho da Magistratura de Pernambuco.
1.1. Protesto como medida prefacial. Em leitura do ditame do artigo 528, parágrafo 1º, do CPC/2015, observe-se que o primeiro ato de coercibilidade ao devedor inadimplente é o de o pronunciamento judicial de sua mora injustificada ser levado, de imediato, a protesto. Medida ordenada pelo juiz, de ofício. Essa determinação antecede, na sequência legal do art. 258, CPC/15, o próprio decreto de prisão civil, que vem referido somente em parágrafo 3º ao mesmo dispositivo. Induvidoso que, a todo rigor, as medidas embora cumulativas não precisarão, em princípio, serem concorrentes em tempo único, ou seja, serem tomadas a um só tempo. Nada impede por pragmática processual e busca mais eficaz de concretude decisória, que a ordem de protesto seja levada a efeito sob primeira providencia, sequenciando-se, em tempo próprio e adequado, o decreto de prisão civil, caso o devedor não pague em cartório a dívida alimentar existente.
2. Configuração de abandono material
Uma segunda medida inibitória processual que se apresenta a contribuir, preventivamente, para a efetividade da prestação jurisdicional é, sem dúvida, a possibilidade já demarcada no novo Código de Processo Civil de o juiz, verificada a conduta procrastinatória do executado, assim entendendo conforme as circunstancias fáticas, dar ciência ao Ministério Público dos indícios da prática do crime de abandono material (artigo 532, CPC/2015).

Convém admitir que a cláusula “conduta procrastinatória” apresenta-se, no caso em espécie, de conceito juridicamente indeterminado, porquanto tanto poderá ter lugar no curso do processo judicial como, sobretudo, pode operar-se em fatos precedentes que terminaram, iniludivelmente, por obrigar o credor a demandar a execução de alimentos ante a desídia daquele obrigado à devida proteção material. Atente-se, no particular, que o crime de abandono material (artigo 244, Código Penal), “é omissivo próprio e se consuma quando o devedor, deixa de prover a subsistência de seus filhos menores não lhes proporcionando os recursos necessários. Portanto, o que a lei pune é o deixar de prover a subsistência da família e, não, o prover insuficientemente”. De todo o seu conduto, a novel disposição do CPC atende, com maior latitude, ao caso concreto, a mesma disposição já contida no artigo 40 Código de Processo Penal.
Logo, em face de ambos os dispositivos, é de se assinalar, sem novidade, que a situação concreta ditará a aplicação pertinente da medida processual que se impõe na espécie. Todavia, consabidamente, o novo ditado da lei processual mais obriga o juiz a refletir, a cada caso, as eventuais hipóteses de abandono material diante da falta imotivada da prestação de alimentos.
3. Hipoteca judiciária
Em sede de pensão de alimentos componente de indenizações por ato ilícito, dispõe o parágrafo 2o do artigo 533 d novo CPC que o juiz poderá substituir a constituição do capital pela inclusão do exequente em folha de pagamento de pessoa jurídica de notória capacidade econômica ou, a requerimento do executado, por fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz. Tais providencias estão prestativas a inibir eventual inadimplência alimentar e melhor protegem os alimentos devidos. Representa uma das medidas inibitórias ao incumprimento da obrigação.

Diferente da penhora, onde a execução ocorre por dívida vencida e o devedor nomeia os bens, com ordem de preferência, a hipoteca é benefício legal em favor do vencedor em ação condenatória, servindo de garantia ao adimplemento da obrigação. A hipoteca independe de pedido do credor, deve ter sua inscrição determinada pelo juiz, por mero despacho, com registro junto à matrícula de bem imóvel do devedor. Não exige, sequer, qualquer procedimento, inclusive o da especialização, reservado apenas à hipoteca legal.
De origem francesa, e introduzida no direito processual brasileiro, por inspiração do art. 676 do Código de Processo Civil português, a hipoteca judiciária tem por pressuposto a existência de uma sentença condenatória; valendo considerar que a imposição do gravame judicial é imediata, ainda que pendente recurso com efeito suspensivo (RT 596/1999).
Assim, a hipoteca judiciária, que se produz fundada pela condenação e surge como efeito imediato e anexo da própria sentença condenatória, assume nos processos de família, importante mecanismo garantidor do julgado. Recolha-se um exemplo: aquele obrigado a prestar alimentos, terá parcela de seu patrimônio imobiliário afetado pela hipoteca, certo que necessário grava-lo no alcance de garantir o cumprimento efetivo da obrigação. A hipoteca devidamente inscrita assegura, em seu fim específico, uma futura e eventual penhora, como eficaz garantia da execução da obrigação alimentar acaso insatisfeita. Trata-se, portanto, de instrumento preventivo de salvaguarda aos interesses do credor, posto à sua disposição.
De fato. A inscrição da hipoteca judiciária, nos processos de família, é de providência objetiva para a sentença obter em sua eficácia, comando de melhor operosidade. Neste sentido, é inegável que o instituto reclama ser melhor aproveitado. Designadamente, a partir das medidas inibitórias processuais que aqui se apresentam, o novo estatuto processual civil coloca-se a melhor servir os alimentos a quem deles precisa. ­­­­­­­­
Jones Figueirêdo Alves é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), onde coordena a Comissão de Magistratura de Família.

Revista Consultor Jurídico, 17 de abril de 2016, 12h58
Extraído do blog Advocacia em Direitos Humanos