sábado, 12 de junho de 2010

Trabalho infantil no esporte é invisível, afirma pesquisadora

Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil, celebrado no dia 12 de junho, será oportunidade para debates com a comunidade

O Paraná aderiu à campanha nacional de erradicação do trabalho infantil que será lançado em Brasília hoje, dia 10. A temática busca destacar a exploração do trabalho infantil no esporte que, segundo profissionais e estudiosos da área da Infância e Adolescência, ainda é invisível para a maior parte da população. Durante as próximas semanas, a temática será debatida por diversas organizações e entidades no Estado.

Conforme a coordenadora do Programa Aprendiz, da Secretaria de Estado da Criança e da Juventude (SECJ), e do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalhador Adolescente (FETI/PR), Regina Bley, o Paraná optou por trabalhar a campanha “Marque um gol: erradique o trabalho infantil’, motivado pela realização da Copa do Mundo, que mobiliza a atenção de boa parcela da sociedade. Segundo ela, o debate sobre o trabalho infantil em todos os setores precisa amadurecer a fim de gerar iniciativas concretas de prevenção. Atualmente, uma das principais ações neste sentido é o Programa de Erradicação do Trabalho Infatil (PETI), que não atinge todos os municípios do país. “As pessoas pensam que o trabalho infantil está apenas na lavoura ou dentro de casa, mas existem outras situações, como a do esporte. Isso precisa ser normatizado – estabelecer o que pode e o que não pode”, explica.

Violações de direitos

Pesquisadora da área da Infância e Adolescência, a advogada Ana Christina Brito Lopes defende que a exploração do trabalho infantil no esporte não é percebida pelos brasileiros. “Existem carreiras glamourosas, como a de modelo ou de ator mirim, que as pessoas até veem como um trabalho, mas no futebol, por exemplo, é diferente”. Muitas vezes o esporte é visto como a “salvação” para a vida da criança ou adolescente e da família de comunidades pobres – mas não por ser um hábito saudável ou como um direito fundamental da população infanto-juvenil. “Com esse incentivo massificante de que o futebol vai salvar, de que a criança tem que ser um Pato ou um Kaká, como fica a cabeça dela? A família vai ser a primeira a apoiar, porque enxerga nisso a galinha dos ovos de ouro. O problema é que o número de jogadores milionários é pequeno e a carreira é efêmera”, pontua Ana Cristina.

Ao buscar as categorias de base, meninas e meninos correm o risco de ter violado vários de seus direitos fundamentais, como o direito à saúde, por conta do desgaste causado pela intensidade dos treinos; o direito à educação e a profissionalização, já que o regime dos centros de formação pode interferir na aprendizagem; o direito à convivência familiar e comunitária e o direito à liberdade, pois é comum que atletas mirins e juvenis que vão para outras cidades em busca de testes fiquem restritos aos centros de formação. Além disso, Ana Christina, que também é doutoranda em sociologia, consultora da OAB/PR no Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e coordenadora do curso de especialização Panorama Interdisciplinar do Direito da Criança e do Adolescente na PUC-PR, lembra que as crianças e adolescentes que estão em teste nos clubes não recebem remuneração. Para evitar algumas dessas violências, o ideal é que os centros, além da equipe esportiva, também fossem compostos por um grupo de profissionais que atuasse diretamente na questão social. Desse modo, garotos e garotas e suas famílias seriam atendidos por psicólogos, pedagogos e assistentes sociais.

Lei Pelé

A legislação que rege a relação de trabalho formal entre atletas juvenis e os clubes (Lei Pelé – 9.615/98) poderá passar por uma modificação. Um dos objetivos do Projeto de Lei 5.186/05, que espera aprovação no Senado, é que os centros de formação deem atendimento completo ao atleta, como educação, alimentação, assistência médica e psicológica, bem como alojamento adequado. Outra questão, conforme a procuradora do Trabalho no Paraná, Mariane Josviak, ex-integrante da Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança, diz respeito à profissionalização do jovem esportista. Segundo ela, quando se tratar de esporte de rendimento, ou seja, a atividade for profissional, o atleta a partir dos 14 anos deverá ser contratado como aprendiz. “Segundo a Lei, o jovem poderá ser aprendiz, mas a PL coloca que o atleta deverá ser ter a iniciação profissional”, pondera.

Agenda

Durante o mês de junho entidades e instituições estão promovendo ações de sensibilização no que diz respeito ao combate à exploração do trabalho infantil. Em Piraquara, Região Metropolitana de Curitiba, a Secretaria Municipal de Assistência Social vai realizar no dia 15 de junho o II Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil. Já em Guarapuava, o SESC em parceria com o Ministério do Trabalho promove no dia 30 um seminário que tem como objetivo mobilizar professores, gestores municipais, empresários e outros multiplicadores. Além disso, a Secretaria de Estado da Criança e da Juventude nos dias 1 e 2 de julho uma capacitação para servidores públicos que atuam diretamente com a população infanto-juvenil a fim de instrumentalizar esses profissionais para o enfrentamento do trabalho que envolve meninos e meninas no Paraná.

Data simbólica

A história do dia 12 de Junho como o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil teve início em 2000, quando entrou em vigor a Convenção nº 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que discute sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil. Mas, somente em 2002, a OIT escolheu a data como marco representativo da luta contra o Trabalho Infantil, durante a Conferência do Trabalho que ocorre anualmente em Genebra (Suíça). No Brasil, a data foi decretada como o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Infantil pela lei 11.542 de 2007, sancionada pelo presidente Lula.

Legislação

Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008, no Brasil existiam 92,5 milhões de pessoas com cinco anos ou mais de idade envolvidas em exploração de trabalho infantil. Destas, 4,5 milhões possuíam entre 5 a 17 anos, sendo 993 mil delas crianças de 5 a 13 anos. Segundo a Emenda Constitucional n° 20, o trabalho de crianças e adolescentes com até 16 anos incompletos é proibido no Brasil, exceto em casos de atividade em caráter de aprendiz, permitido a partir dos 14 anos. Nesse caso, a ação exercida visa a aprendizagem profissional. Mesmo em situação de trabalho para adolescentes de 16 a 18 anos, há restrições legais quanto às atividades a serem realizadas. Nessa faixa etária, a atividade não pode ser realizada em horário noturno nem em períodos que comprometam a freqüência escolar; não pode representar perigo para o jovem, nem ser insalubre ou penoso. Além disso, a legislação aponta que o trabalho não deve ser exercido em locais prejudiciais ao desenvolvimento físico, psíquico, moral e social.

Projeto Catavento

Com a intenção de garantir os direitos de diversas crianças e adolescentes que trabalhavam em estacionamentos de mercados, na coleta de materiais recicláveis e até em canteiros de obras, a Ciranda – Central de Notícias dos Direitos da Infância e da Adolescência deu início em 2007 ao Projeto Catavento. As atividades lúdicas, que envolvem crianças entre sete e 14 anos, são desenvolvidas em Colombo-PR, no bairro JardimLiberdade. Na etapa de 2009, o projeto avançou para o campo da geração de renda, capacitando para a panificação e artesanato mães, tias e avós de meninas e meninos atendidos pelo Catavento. Conforme a gestora de projetos da Ciranda, Maria José Machado, o resultado já pode ser constatado na comunidade: rendimento escolar por parte das crianças e conscientização dos direitos fundamentais da população infanto-juvenil por parte das famílias.


O que diz ECA

Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz.
Art. 61. A proteção ao trabalho dos adolescentes é regulada por legislação especial, sem prejuízo do disposto nesta Lei.
Art. 62. Considera-se aprendizagem a formação técnico-profissional ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação de educação em vigor.
Art. 67. Ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido em entidade governamental ou não-governamental, é vedado trabalho:
I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e as cinco horas do dia seguinte;
II - perigoso, insalubre ou penoso;
III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social;
IV - realizado em horários e locais que não permitam a freqüência à escola.
Art. 69. O adolescente tem direito à profissionalização e à proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros:
I - respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;
II - capacitação profissional adequada ao mercado de trabalho.
Art. 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente.


Sugestão de fontes

Ordem dos Advogados do Brasil/Subseção PR
Ana Christina Brito Lopes – consultora do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente
(41) 9669-1457

Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil (FETI)
Regina Bley – coordenadora colegiada do FETI e coordenadora estadual do Programa Aprendiz
(41) 3270-1096

Ciranda – Central de Notícias dos Direitos da Infância e Adolescência
Maria José Machado dos Santos – gestora do projeto Catavento
(41) 3023-3925

Ministério Público do Trabalho no Paraná
Mariane Josviak - procuradora do Trabalho no Paraná
(41) 3304-9143

Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Paraná (SRTE-PR)
Fernanda Matzenbacher – coordenadora da Fiscalização do Trabalho Infantil no Paraná
(41) 3901-7550

Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social (SETP)
Carmen Cristina Pereira da Silva Zadra – técnica da Coordenadoria de Apoio à Gestão Municipal
(41) 3883-2631

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI)
Adriano Mário Guzoni – diretor de Proteção Social Especial da FAS (Fundação de Ação Social)
(41) 3250-7913

Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI)
Isa Maria de Oliveira - secretária executiva
(61) 2025-3880

Organização Internacional do Trabalho (OIT) - Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil
Renato Mendes - coordenador nacional
(61) 2106-4600 / 2106-4634

Instituto Lixo e Cidadania
Suelita Rocker – coordenadora
(41) 3079-8620

Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA)
(41) 3270-1042


Sugestão de abordagem


A questão cultural está bastante relacionada ao trabalho infantil – de que é preferível que o adolescente ou criança esteja trabalhando, mesmo que em condições de insalubridade, do que ocioso. Porém, o Estatuto da Criança e do Adolescente garante que a meninas e meninos brinquem, estudem e pratiquem esportes, atividades que podem ser colocadas em segundo plano pela exploração do trabalho infantil. Essas ações são imprescindíveis para o desenvolvimento de pessoas nesta faixa etária. Tais direitos são violados por alguns centros de formação de atletas infanto-juvenis, que não oferecem a assistência ideal nem condições adequadas para estadia. Apesar disso, todos os dias, crianças e jovens migram entre cidades e estados para participar de testes em clubes. O foco da reportagem poderá abordar as dificuldades impostas por esse regime, principalmente quanto à educação. Uma das modificação na Lei Pelé proposta no PL 5.186/05 é que garotas e garotos que participarem de testes permaneçam nos clubes ao menos durante seis meses, para garantir o semestre escolar.

Enviado por CIRANDA - Central de Notícias dos Direitos da Infância e Adolescência.

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